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sexta-feira, 11 de março de 2011

Fernando Pessoa e uma homenagem

Por: Alexandre Mendes


   Ainda lembro de muitas coisas do meu passado que me marcaram. Umas boas, muitas ruins. O passado...o meu, comparo a um domador de cavalos montado em um puro sangue selvagem. A vida presa a uma simples corda no pescoço do animal. Ainda sinto os solavancos do cavalo, mas, a cada dia que passa, mais eu sei como domá-lo. Chamo a isso de experiência pessoal. Fui menino e aprendi algumas coisas da vida pelo amor, no entanto, muitas dessas coisas foram ensinadas pela dor. Ainda admito minha constante necessidade de aprender e acredito que até o fim da vida, eu aprenderei muita coisa.
   Comemorando o meu trigésimo quarto ano por aqui, (12 de março) cito a poesia de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa), intitulada "Aniversário". Dedico essa poesia a família que não tive quando menino e especialmente a minha mãe. Se ela ainda estivesse por aqui, as coisas teriam sido bem mais fáceis para mim.
Obrigado


  À Lecy Mendes Vidinha (1946-1995)




Aniversário
Por: Álvaro de Campos
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa como uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar pela vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim mesmo,
O que fui de coração e parentesco,
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui – ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui…
A que distância!…
(Nem o acho…)
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a humidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes…
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio…
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos…
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim…
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui…
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas – doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado –,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos…
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!…
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!…

5 comentários:

  1. Vi e ouvi o meu marido lendo essa poesia, ele chorou... Resolvi ler agora e entendi o tamanho da emoção dele...Viajei no tempo... A imaginação é algo fantástico... O Alê me incentiva a ler sempre. Quando leio um texto dele, sinto muito orgulho de ser sua esposa.

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  3. Mais um ano se vai e mais um ano chega.
    As dificuldades são muitas, mas "se fosse fácil, qualquer um fazia"*.
    Vamos transpor os obstáculos.
    Estamos em uma guerra desigual contra um sistema que tem a função de nos triturar por não aceitarmos seguir com o rebanho, mas temos uma arma secreta que podemos chamar de vontade.
    Che contava com essa arma em seus guerrilheiros e até chegar a derrota final passou por muitas vitórias grças a ela.
    A vontade é tudo o que realmente temos.
    Mergulhe de cabeça em tudo que você acredita. Negar a nossa fé na luta é negar nossa vontade e assim negar nossa vida. Nada é a toa. Nos privar desses mergulhos é vir ao mundo e perder a viagem. Trocar a força pelo mundo ilusório imposto é ver a vida perder o sentido.
    A vida só tem sentido quando estamos sendo nós mesmos e você é um cara maravilhoso que, quando resolve ser você, ilumina tudo ao redor.
    Valeu por compartilhar dessa luz.

    "se fosse fácil, qualquer um fazia" é uma frase do eterno Ministro do Baião Zé Mohura

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  4. Parabéns! Você é um poeta incrível, uma ave rara! Se morasse aqui íamos comemorar o aniversário juntos com uma mega festa cheia de álcool hahahah!! faço aniversário dia 21 de março!!!

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  5. "Serei velho quando o for". Alexandrão, sinto que seremos eternamente jovens. O tempo passa, mas o espírito continua forte e desbravador. Os dias nos vão somando e muitos ainda hão de se somar.

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